Fernanda Ezabellajohn fante – Fernanda Ezabella http://fernandaezabella.blogfolha.uol.com.br Hollywood e outras viagens Mon, 18 Nov 2013 05:12:22 +0000 pt-BR hourly 1 https://wordpress.org/?v=4.7.2 Los Angeles de Arturo Bandini http://fernandaezabella.blogfolha.uol.com.br/2012/05/03/los-angeles-de-arturo-bandini/ http://fernandaezabella.blogfolha.uol.com.br/2012/05/03/los-angeles-de-arturo-bandini/#comments Thu, 03 May 2012 10:00:06 +0000 http://fernandaezabella.blogfolha.uol.com.br/?p=723 Continue lendo →]]> From Dan Fante

Para quem vier a Los Angeles para uma peregrinação em Bunker Hill é bom saber: Bunker Hill não existe. O bairro, um dos primeiros subúrbios de Los Angeles, foi destruído no final dos anos 60. O tal do “hill” (colina) foi aplainado, fazendo sumir mais de 7 mil casas e apartamentos.

Mas ainda restam cenários de Los Angeles por onde circularam John Fante (1909-1983) e seu intrépido personagem alter-ego Arturo Bandini. Charles Bukowski também se mudou para Bunker Hill depois de ler “Pergunte ao Pó”.

No mês passado, no dia em que Fante completaria 103 anos, fiz um tour de uma empresa chamada Esotouric, fundada por Richard Schave, mesmo figura que batalhou para a prefeitura colocar a placa do foto acima, que levou uns três anos e só foi instalada em 2010.

Schave diz que Fante é incrivelmente pouco apreciado nos EUA, com mais fama na Europa. Tanto que esta tour só é feita uma vez por ano.

Bunker Hill, ele diz, era como as casinhas de madeira estilo vitoriano que ainda existem em San Francisco. No busão do tour, ele passa vários vídeos de como era antes enquanto passamos pelas mesmas ruas, agora com prédios monstruosos de vidro.

A placa acima fica na esquina da Biblioteca Central, entre Grand Avenue a 5th Street. De “praça” (square), não tem nada e nem vale a pena ir só para ver. Mas pode valer para dar uma entrada na biblioteca. Era aqui que Charles Bukowski frequentava e onde leu Fante pela primeira vez (para ser mais exata, na parte onde hoje é “Children’s Literature”).

From Dan Fante

O que sobrou de Bunker Hill é bondinho “Angels Flight“, apelidado de “a menor rodovia do mundo”, que levava ao topo do bairro. Na verdade, mudaram o bondinho um quarteirão de distância e hoje leva a lugar nenhum (quer dizer, leva a uma praça sem graça com um monte de arranha-céu) por 50 centavos de dólar.

Bandini pegava o Angels Flight (ou descia pela escadaria para não pagar) para chegar ao centrão de Los Angeles ou ir ao mercadão Grand Central, bem em frente, que funciona desde 1917. É aqui que ele comprava suas laranjas do japonês simpático em “Pergunte ao Pó” (1939) ou “Sonhos de Bunker Hill” (1982).

From Dan Fante

Perto também ficava a loja da Goodwill, onde Bandini comprava suas roupas usadas com os cheques que recebia do editor. Mas hoje o lugar é uma igreja, entre a Broadway Street e a 3rd St. Aquele bar de striptease Follies, que Bandini se apaixona por uma dançarina e manda uma carta bregosa para ela, é hoje um estacionamento, na altura do número 550 da Main St.

Para entrar no clima boêmio, siga para o “dive bar” King Eddy Saloon, cujo logo é “Where nobody gives a shit about your name”. Fante frequentava bastante aqui, assim como Charles Bukowski, quando ambos não estavam no Musso & Frank, em Hollywood. E Bandini vem torrar uma grana que recebe da mãe pelo correio.

O bar fica na Los Angeles Street com a 5th St. É um lugar meio barra pesada para ir à noite sozinho. De dia é tranquilo. Como quase todos os bares históricos de LA, este também tem hoje televisões passando jogo. Meio deprê.

From Dan Fante
From Dan Fante

Para uma passagem mais santa, ao estilo “altar boy” de Fante, vá às raízes mexicanas de Los Angeles, no bairro El Pueblo.

Quem não lembra da igreja La Placita? Bandini entra desesperado (acho que passava por um bloqueio de escritor) e é abordado por uma prostituta enquanto reza. Ele recusa o programa, mas depois  morre de inveja ao vê-la saindo com um mexicano. Ele xinga os mexicanos e a espera. No quarto com ela, Bandini tem medo, não fazem sexo e ele apenas dá quase todo seu dinheiro para ela.

From Dan Fante

Bom, a igreja existe e vai bem (foto acima). Fica numa parte histórica da cidade bacana, na Spring Street, quase em frente a um prédio que foi um dia um hotel famoso, Pico House ou National Hotel, “o mais fino do sul da Califórnia”, no começo do século 20. Fante se hospedou aqui nos anos 30.

Também perto fica a Olvera Street, rua mais antiga da cidade, repleta de lojinhas de souvernires mexicanos.

From Dan Fante

Amanhã, posto a Los Angeles de Charles Bukowski.

]]>
8
Entrevista com o filho de John Fante - trechos http://fernandaezabella.blogfolha.uol.com.br/2012/05/02/entrevista-com-o-filho-de-john-fante-trechos/ http://fernandaezabella.blogfolha.uol.com.br/2012/05/02/entrevista-com-o-filho-de-john-fante-trechos/#comments Wed, 02 May 2012 10:01:24 +0000 http://fernandaezabella.blogfolha.uol.com.br/?p=685 Continue lendo →]]>

John Fante e seu cão Rocco

Seguindo o post de ontem, vou jogar aqui alguns trechos da entrevista com Dan Fante:

“Meu pai não queria ser interpretado como radical. Queria ser convencional.” 

Sobre a geração Beat:

“John Fante não era um admirador dos beats. ‘On The Road’ é um livro difícil de ler, você tem a impressão de que Jack Kerouac está bêbado o tempo todo, divagando sem parar. Ia contra a convenção literária. Meu pai não achava que era um bom livro e ele estava certo. Apesar de que…. ele admirava as pessoas pelo o que estavam fazendo, pela revolução literária, mas não admirava a literatura particularmente. Mas meu pai gostava de Ginsberg e Ferlinghetti.”

Sobre Charles Bukowski: 

“Ele gostava de Bukowski, tiveram uma grande amizade. Mas meu pai não entendia o oba-oba com sua obra. Ele sentia a mesma coisa que eu. Bukowski era um grande poeta, toda poesia que eu escrevi é realmente por causa dele. Mas não gostava muito de seus romances, não eram grande literatura.”

Sobre religião:

“É bem interessante. Meu pai, quando jovem, teve várias experiências espirituais poderosas. Não coloquei isto no livro, mas talvez devesse. Ele era católico e, quando garoto, tinha visões da Virgem Maria. Ele era bem religioso, era um “altar boy” e foi católico a vida toda. Ia à igreja, não com muita frequência, mas ia. Muitas vezes ficava irritado com o padre, se levantava e ia embora no meio da missa. Mas ele tinha muitos amigos que eram padres e os admirava muito. Ele tinha grande admiração por pessoas de espiritualidade.”

Dois trechos bacanas do livro:

Processo de escrever – “Maior parte de seu trabalho fazia em casa, no meio da noite, entre três e seis da manhã, cartas, romances, roteiros. Desde cedo já sabia que só precisava de quatro horas de sono por dia. Sobrevivia de café e 50 cigarros por dia […] Primeiro escrevia e reescrevi o livro inteiro em sua cabeça. Por meses andava por ai grunhindo diálogos estranhos, rosnando para as pessoas. Depois, finalmente, sentava e escrevia tudo […] Às vezes, no jantar, ele contava um ou dois capítulos inteiros para a família.”

Sempre escritor – “Meu pai era um artista, ganhando, perdendo ou empatando. Ele evitou sua paixão por longos períodos mas nunca a negou […] A maioria de seus romances foi escrita por nada. Não por fama, não para reconhecimento. Ele escrevia porque era escritor […] Este exemplo de perseverança me fez amá-lo com todo meu coração.”

Joyce e John Fante, no final da vida, finalmente em "good terms"

Dicas de John Fante para o filho Dan, tiradas do livro “Fante”:

“Stay with it kid, the more you write the better you will get”.

“Give it until you’re fifty, Dan. You might be a writer too. Just don’t rush it. Let it come to you. Keep trying”.

“Look, I have said before, give it time, kid. A man has to mature, to discover himself. I wish to Christ I’d started later – that I hadn’t derailed my life at the studios.”

Amanhã eu posto aqui sobre a Tour John Fante em Los Angeles

]]>
5
De carona com o filho do John Fante http://fernandaezabella.blogfolha.uol.com.br/2012/05/01/de-carona-com-fante/ http://fernandaezabella.blogfolha.uol.com.br/2012/05/01/de-carona-com-fante/#comments Tue, 01 May 2012 10:14:15 +0000 http://fernandaezabella.blogfolha.uol.com.br/?p=613 Continue lendo →]]> From Dan Fante

Semana passada, peguei uma carona com Dan Fante. Ele me chamou de marciana. “Como assim veio de ônibus?” Assim é Los Angeles, todo mundo tem carro e acha estranho quando alguém surge de busão.

Ele me levou para casa depois de um almoço no Musso & Frank, restaurante mais antigo de  Hollywood, frequentado pelo seu pai, John Fante, e a nata literária da cidade, como Raymond Chandler, Dashiell Hammett e F. Scott Fitzgerald. Charles Bukowski também batia cartão aqui.

Conversamos sobre seu livro mais recente, “Fante – A Family’s Legacy of Writing, Drinking and Surviving”, suas memórias sobre seus dias loucos movidos a álcool, seus subempregos e, claro, a relação com seu pai (1909-1983).

John e Dan Fante em 1949 ou 1950, em Los Angeles

Saiu uma matéria na Ilustrada de domingo, mas o espaço era tão pequeno que me revoltei não deu conta nem de um décimo do assunto. Vou jogar algumas coisas no blog.

Dan, 68, é o segundo dos quatro filhos que John Fante teve com Joyce, morta em 2005. O mais velho, Nick, morreu de tanto beber em 1997. Na foto abaixo, a tatuagem que Dan fez após a morte do irmão.

Além da relação com o pai, o livro também trata da agonia que John sentia de “ter se vendido” para os estúdios de cinema e deixado sua carreira literária de lado.

Filho de imigrantes italianos, John cresceu bastante pobre em Denver, Colorado, e se deixou levar pelos gordos cheques que ganhava como roteirista em Los Angeles, gastos em campos de golfe, longas noites de pôquer, carros usados (em dez anos, acumulou várias dezenas) e, claro, bebedeiras no Musso & Frank.

Também teve a fase dos cachorros. Chegou a ter dez, incluindo o violento Rocco, inspiração para o livro “My Dog Stupid”.

Lembro de reler “Pergunte ao Pó” e “Sonhos de Bunker Hill” e dar risada em voz alta com as canalhices de Arturo Bandini, seu alter-ego. Mas no livro do filho, John Fante aparece apenas canalha, sem o lado cômico.

Dan escreveu seu primeiro romance aos 47 anos, quando não tinha um centavo no bolso e voltava a morar com mãe. Desde os 10 anos ele já arriscava alguma coisa e, certa vez, resolveu mostrar um conto para o pai, que apenas disse: “Esqueça este lixo e se concentre em passar de ano. Face it, you are not a genius, kid.”

Quando fez 30 anos, voltou a falar com o pai. De folga dos empregos bizarros** em Nova York, Dan visitava a casa da mãe em Malibu e lia suas histórias para John, que passou a ser mais receptivo. Ele conta como a relação mudou:

“[Perdoei] meu pai quando percebi que ele não era o inimigo. Eu era o inimigo, eu tinha muitos problemas. Quando percebi isto, passei a ter mais compaixão, em vez de ficar irritado. Fernanda, ele não era uma pessoa fácil. Ele era intenso, meio como Picasso, sempre sofrendo, batalhando. Quando ele percebeu que eu estava escrevendo, começou a me apoiar mais, ficamos mais próximos. Você precisa aceitar seu pai do jeito que ele é. Viramos amigos.”

“É difícil descrever num livro. Mas meu pai era mágico. Quando ele falava, era lindo, parecia apresentador de noticiário de TV, gramática e dicção perfeitas. Era um cara esperto e muito engraçado, que leu de tudo, muito bem educado. Mas uma pessoa bastante incomum. Com uma presença forte. Você o conhece e sabe que está com alguém especial, mesmo sem saber quem é.”

Hoje, Dan tem 11 livros publicados, incluindo um de poesia e duas peças de teatro. A maioria ganhou ótimas resenhas. Recomendo seu romance de estreia, “Chump Change”.

Foi ele quem teve que tomar a decisão de desligar os aparelhos quando John Fante estava nas últimas no hospital. Dan também conta como ajudou John, cego e com as pernas amputadas, a terminar “Sonhos de Bunker Hill”, escolhendo a frase final do livro, uma aspas que Bandini rouba de Lewis Carroll.

Abaixo estão alguns vídeos caseiros que fiz com ele depois do almoço. Reparem nos anéis dourados nos dedos, o piercing no nariz e as pulseiras de ouro. A da mão esquerda foi feita com as plaquinhas de aniversário sem beber (ele tem 25!).

[There is a video that cannot be displayed in this feed. Visit the blog entry to see the video.]

[There is a video that cannot be displayed in this feed. Visit the blog entry to see the video.]

[There is a video that cannot be displayed in this feed. Visit the blog entry to see the video.]

Amanhã eu posto mais uns trechos da entrevista e, nos dias seguintes, sobre a “Tour John Fante” e a “Tour Charles Bukowski” em Los Angeles.

(** Entre os “empregos bizarros” estão: apresentador de circo, vendedor de aspirador de pó, detetive, motorista de mafiosos, conselheiro amoroso, vendedor ambulante em Wall Street. Também foi taxista, motorista de limusine e criador de um programa de rádio com o primeiro super-herói negro dos EUA.)

]]>
5