Para quem vier a Los Angeles para uma peregrinação em Bunker Hill é bom saber: Bunker Hill não existe. O bairro, um dos primeiros subúrbios de Los Angeles, foi destruído no final dos anos 60. O tal do “hill” (colina) foi aplainado, fazendo sumir mais de 7 mil casas e apartamentos.
Mas ainda restam cenários de Los Angeles por onde circularam John Fante (1909-1983) e seu intrépido personagem alter-ego Arturo Bandini. Charles Bukowski também se mudou para Bunker Hill depois de ler “Pergunte ao Pó”.
No mês passado, no dia em que Fante completaria 103 anos, fiz um tour de uma empresa chamada Esotouric, fundada por Richard Schave, mesmo figura que batalhou para a prefeitura colocar a placa do foto acima, que levou uns três anos e só foi instalada em 2010.
Schave diz que Fante é incrivelmente pouco apreciado nos EUA, com mais fama na Europa. Tanto que esta tour só é feita uma vez por ano.
Bunker Hill, ele diz, era como as casinhas de madeira estilo vitoriano que ainda existem em San Francisco. No busão do tour, ele passa vários vídeos de como era antes enquanto passamos pelas mesmas ruas, agora com prédios monstruosos de vidro.
A placa acima fica na esquina da Biblioteca Central, entre Grand Avenue a 5th Street. De “praça” (square), não tem nada e nem vale a pena ir só para ver. Mas pode valer para dar uma entrada na biblioteca. Era aqui que Charles Bukowski frequentava e onde leu Fante pela primeira vez (para ser mais exata, na parte onde hoje é “Children’s Literature”).
O que sobrou de Bunker Hill é bondinho “Angels Flight“, apelidado de “a menor rodovia do mundo”, que levava ao topo do bairro. Na verdade, mudaram o bondinho um quarteirão de distância e hoje leva a lugar nenhum (quer dizer, leva a uma praça sem graça com um monte de arranha-céu) por 50 centavos de dólar.
Bandini pegava o Angels Flight (ou descia pela escadaria para não pagar) para chegar ao centrão de Los Angeles ou ir ao mercadão Grand Central, bem em frente, que funciona desde 1917. É aqui que ele comprava suas laranjas do japonês simpático em “Pergunte ao Pó” (1939) ou “Sonhos de Bunker Hill” (1982).
Perto também ficava a loja da Goodwill, onde Bandini comprava suas roupas usadas com os cheques que recebia do editor. Mas hoje o lugar é uma igreja, entre a Broadway Street e a 3rd St. Aquele bar de striptease Follies, que Bandini se apaixona por uma dançarina e manda uma carta bregosa para ela, é hoje um estacionamento, na altura do número 550 da Main St.
Para entrar no clima boêmio, siga para o “dive bar” King Eddy Saloon, cujo logo é “Where nobody gives a shit about your name”. Fante frequentava bastante aqui, assim como Charles Bukowski, quando ambos não estavam no Musso & Frank, em Hollywood. E Bandini vem torrar uma grana que recebe da mãe pelo correio.
O bar fica na Los Angeles Street com a 5th St. É um lugar meio barra pesada para ir à noite sozinho. De dia é tranquilo. Como quase todos os bares históricos de LA, este também tem hoje televisões passando jogo. Meio deprê.
Para uma passagem mais santa, ao estilo “altar boy” de Fante, vá às raízes mexicanas de Los Angeles, no bairro El Pueblo.
Quem não lembra da igreja La Placita? Bandini entra desesperado (acho que passava por um bloqueio de escritor) e é abordado por uma prostituta enquanto reza. Ele recusa o programa, mas depois morre de inveja ao vê-la saindo com um mexicano. Ele xinga os mexicanos e a espera. No quarto com ela, Bandini tem medo, não fazem sexo e ele apenas dá quase todo seu dinheiro para ela.
Bom, a igreja existe e vai bem (foto acima). Fica numa parte histórica da cidade bacana, na Spring Street, quase em frente a um prédio que foi um dia um hotel famoso, Pico House ou National Hotel, “o mais fino do sul da Califórnia”, no começo do século 20. Fante se hospedou aqui nos anos 30.
Também perto fica a Olvera Street, rua mais antiga da cidade, repleta de lojinhas de souvernires mexicanos.
Amanhã, posto a Los Angeles de Charles Bukowski.